sábado, 13 de abril de 2013

CRÔNICAS

AMOR E INVEJA 

São comuns as pessoas se encantarem por outras que possuem características de personalidade que elas não têm e gostariam de ter. Só não sei se numa relação amorosa entre pessoas tão diferentes há espaço para uma vida a dois satisfatórios. 

Quando um homem tímido e inseguro se casa com uma mulher extrovertida, falante, cheia de amigos, o que pode acontecer à vida deles? À primeira vista só coisas boas, claro. Ela possui o que falta a ele e, portanto, pode ajudá-lo a ser mais comunicativo, se soltar mais, conhecer mais pessoas. Um complementa o outro. Esse encaixe parece ser a solução perfeita. 

Além do tímido e da extrovertida, conhecemos também o decidido e a indecisa, o animado e a deprimida, o alienado e a sabe-tudo, a corajosa e o medroso, entre outros. Sem contar que existem várias outras diferenças sutis, difíceis de ser percebidas. Mas na maioria dos casos essa situação é bem mais complicada do que parece e surgem problemas. O primeiro deles é a acomodação. Ela impede o crescimento pessoal; o indeciso acaba deixando o outro resolver todas as questões que necessitem de decisão, não se empenhando para modificar o que não gosta em si próprio. 

Entretanto, há no amor entre duas pessoas muito diferentes um inconveniente mais sério e bastante comum: a inveja. Há quem diga até que a inveja nasce imediata e espontaneamente da admiração. Será que quando admiramos e nos encantamos tanto por alguém oposto a nós, estamos realmente satisfeitos com o que somos? O invejoso admira o invejado, desejaria estar em seu lugar, ser como ele é e não consegue. O pior é quando o invejoso, não suportando a sua própria inveja, passa a depreciar no outro, justamente os aspectos que gostaria de possuir. Ou então, o que também ocorre com freqüência, sutilmente sabota as realizações do parceiro, numa tentativa desesperada de diminuir seu sentimento de inferioridade. 

Na fase do encantamento apaixonado a inveja não se manifesta, por mais diferentes que sejam as pessoas. O que elas vivenciam é a ilusão da fusão romântica, em que os dois se transformam num só. Nesse momento não se deseja nada do outro além do amor. Contudo, todos sabem que esse período inicial de paixão não resiste à convivência cotidiana. 

Portanto, quando a inveja surge é um sinal de que o encantamento chegou ao fim. 


Autora: Regina Navarro Lins

Psicanalista e Sexóloga
Autora: do Livro “Ouro do Sexo
Editora: Ediouro
Enviado: Marly Santanelli
Site: http://www.velhosamigos.com.br 








DE REPENTE 60 (ou 2x30) 


Ao completar sessenta anos, lembrei do filme “De repente 30”, em que a adolescente, em seu aniversário, ansiosa por chegar logo à idade adulta, formula um desejo e se vê repentinamente com trinta anos, sem saber o que aconteceu nesse intervalo. Meu sentimento é semelhante ao dela: perplexidade. 

Pergunto a mim mesma: onde foram parar todos esses anos? Ainda sou aquela menina assustada que entrou pela primeira vez na escola, aquela filha desesperada pela perda precoce da mãe; ainda sou aquela professorinha ingênua que enfrentou sua primeira turma, aquela virgem sonhadora que entrou na igreja, vestida de branco, para um casamento que durou tão pouco!Ainda sou aquela mãe aflita com a primeira febre do filho que hoje tem mais de trinta anos. Acho que é por isso que engordei, para caber tanta gente, é preciso espaço! Passei batido pela tal crise dos trinta, pois estava ocupada demais lutando pela sobrevivência. Os quarenta foram festejados com um baile, enquanto eu ansiava pela aposentadoria na carreira do magistério, que aconteceu quatro anos depois. Os cinqüenta me encontraram construindo uma nova vida, numa nova cidade, num novo posto de trabalho. Agora, aos sessenta, me pergunto onde está a velhinha que eu esperava ser nesta idade e onde se escondeu a jovem que me olhava do espelho todas as manhãs. 

Tive o privilégio de viver uma época de profundas e rápidas transformações em todas as áreas: de Elvis Presley e Sinatra a Michael Jackson, de Beatles e Rolling Stones a Madonna, de Chico e Caetano a Cazuza e Ana Carolina; dos anos de chumbo da ditadura militar às passeatas pelas diretas e impeachment do presidente a um novo país misto de decepções e esperanças; da invenção da pílula e liberação sexual ao bebê de proveta e o pesadelo da AIDS. Testemunhei a conquista dos cinco títulos mundiais do futebol brasileiro (e alguns vexames históricos). 

Nasci no ano em que a televisão chegou ao Brasil, mas minha família só conseguiu comprar um aparelho usado dez anos depois e, por meio de suas transmissões, viram a chegada do homem à lua, a queda do muro de Berlim e algumas guerras modernas. Passei por três reformas ortográficas e tive de aprender a nova linguagem do computador e da internet. Aprendi tanto que foi por meio desta que conheci, aos cinqüenta e dois anos, meu companheiro, com quem tenho, desde então, compartilhado as aventuras do viver. Não me sinto diferente do que era há alguns anos, continuo tendo sonhos, projetos, faço minhas caminhadas matinais com meu cachorro Kaká pratica ioga, me alimento e durmo bem (apesar das constantes visitas noturnas ao banheiro), gosto de cinema, música, leio muito, viajo para os lugares que um dia sonhei conhecer. 

Por dois anos não exerci qualquer atividade profissional, mas voltei a orientar trabalhos acadêmicos e a ministrar algumas disciplinas em turmas de pós-graduação, o que me fez rejuvenescer em contato com os alunos, que têm se beneficiado de minha experiência e com quem tenho aprendido muito mais que ensinado. Só agora comecei a precisar de óculos para perto (para longe eu uso há muitos anos) e não tinjo os cabelos, pois os brancos são tão poucos que nem se percebe (privilégio que herdei de meu pai, que só começou a ficar grisalho após os setenta anos). 

Há marcas do tempo, claro, e não somente rugas e os quilos a mais, mas também cicatrizes testemunham de algumas aprendizagens: a do apêndice me traz recordações do aniversário de nove anos passado no hospital; a da cesárea marca minha iniciação como mãe e a mais recente, do câncer de mama (felizmente curado), me lembram diariamente que a vida nos traz surpresas nem sempre agradáveis e que não tenho tempo a perder. A capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo diminuiu, lembro de coisas que aconteceram há mais de cinqüenta anos e esqueço as panelas no fogo. Aliás, a memória (ou sua falta) merece um capítulo à parte: constantemente procuro determinada palavra ou quero lembrar o nome de alguém e começa a brincadeira de esconde-esconde. Tento fórmulas mnemônicas, recito o alfabeto mentalmente e nada! De repente, quando a conversa já mudou de rumo ou o interlocutor já se foi, eis que surge o nome ou palavra, como que zombando de mim... 

Mas, do que é que eu estava falando mesmo?Ah, sim, dos meus sessenta. 

Claro que existem vantagens: pagar meia-entrada (idosos, crianças e estudantes têm essa prerrogativa, talvez porque não são consideradas pessoas inteiras), atendimento prioritário em filas exclusivas, sentar sem culpa nos bancos reservados do metrô e a TPM passou a significar “Tranqüilidade Pós-Menopausa”. Certamente o saldo é positivo, com muitas dúvidas e apenas uma certeza: tenho mais passado que futuro e vivo o presente intensamente, em minha nova condição de mulher muito sex agenária! 



Autora: Regina de Castro Pompeu.
Enviado por: Marília Belizzi




OS DOMINGOS PRECISAM DE FERIADOS 


Toda sexta-feira à noite começa o Shabat para a tradição judaica. Shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção, inspirado no descanso divino no sétimo dia da Criação. Muito além de uma proposta trabalhista, entendemos a pausa como fundamental para a saúde de tudo o que é vivo. A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue. 

Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente, onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do planeta. Hoje, o tempo de "pausa" é preenchido por diversão e alienação. Lazer não é feito de descanso, mas de ocupações para não nos ocuparmos. A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar. E a incapacidade de parar é uma forma de depressão. O mundo está deprimido e a indústria do entretenimento cresce nessas condições. Nossas cidades se parecem cada vez mais com a Disneylândia. Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas. Fim de dia com gosto de vazio. Um divertido que não é nem bom nem ruim. Dia pronto para ser esquecido, não fossem as fotos e a memória de uma expectativa frustrada que ninguém revela para não dar o gostinho ao próximo... 

Entramos no milênio num mundo que é um grande shopping. A internet e a televisão não dormem. Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme. As bolsas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder, das informações e dos rumores, atividade incessante. A CNN inventou um tempo linear que só pode parar no fim. Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo. Sem acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente, mas ao custo fóbico de uma paisagem que passa. O futuro é tão rápido que se confunde com o presente. As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de um feriado... 

Nossos namorados querem "ficar", trocando o "ser" pelo "estar”. Saímos da escravidão do século XIX para o leasing do século XXI - um dia será nosso?Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante. Nunca fizemos tanto e realizamos tão pouco. Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos... Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção. O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair literalmente, ficar desatento. É um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida. A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é: o que vamos fazer hoje? Já marcada pela ansiedade. E sonhamos com uma longevidade de 120 anos, quando não sabemos o que fazer numa tarde de domingo. 

Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se mortalmente. É este o grande "radical livre" que envelhece nossa alegria - o sonho de fazer do tempo uma mercadoria. Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas que são milenares. A pausa é que traz a surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à caminhada. A prática espiritual deste milênio será viver as pausas. Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e quando algo vai começar. 

Afinal, por que o Criador descansou? Talvez porque, mais difícil do que iniciar um processo do nada seja dá-lo como concluído. 



Autor: Rabino Nilton Bonder
Enviado por: Wanda Cotelo
Site: http://www.velhosamigos.com.br









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